Nuno Saraiva: Diário de uma Quarentena em Risco

Capa de “Diário de uma Quarentena em Risco”.

março, 2022

Nuno Saraiva: Diário de uma Quarentena em Risco

Um cartoon por dia durante 200 dias, entre confinamentos, desconfinamentos e sobretudo desconfiamentos. 100 desenhos sintomáticos desse ano “em banho-maria”. É este o retrato de “Diário de Uma Quarentena em Risco”, de Nuno Saraiva. Editado pela Pim! Edições, o livro foi, numa primeira fase, publicado em dezembro pelo jornal Público (bancas e loja online) e segue para as livrarias este mês.  

A ideia surgiu em momentos em que Nuno “pouco ou nada tinha que fazer nas primeiras horas da manhã. Levava a minha filha à escola e depois reservava uma parte do tempo ao cartoon”, explica o ilustrador. Findo o primeiro confinamento, o desafio prosseguiu: “Até junho de 2020, continuámos em casa, e eu obriguei-me sempre a fazer um cartoon por dia. Depois desconfinámos e eu queria tudo menos ficar em casa a desenhar. Mas estruturava os tempos e castigava-me – fazia a vez do editor”, explica.  

Cartoon alusivo à guerra na Ucrânia, publicado a 1 de março deste ano.

Desenhados à mão e trabalhados a tinta-da-china ou lápis, os cartoons são depois acabados a cores “como se fossem aguarelas ou canetas de filtro no Photoshop ou noutras aplicações.” Inicialmente, tinham sido meramente pensados para entreter, mas aos poucos foram ganhando inevitáveis contornos políticos: “Toda esta situação pandémica está misturada com uma crise económica, social, política, de valores, e é nestas situações em que estamos assustados que começam a surgir os monstros.” Foi essa a mensagem por detrás do poster com que Nuno Saraiva retribuiu o convite (há muito por ele ansiado) do POSTER para expor a sua arte em Marvila. “Desde o início que eu conheço o POSTER e o achava fascinante. Às vezes, tinha mesmo inveja, alguma raiva até, e pensava: ‘mas nunca me chamam?’”, graceja. À sexta foi de vez: “Foi o acaso… e esta coisa da pandemia fez com que eu desse um grande salto. Investi muito nas minhas redes sociais e com isso ganhei visibilidade.” 

Mural em BD que conta uma versão muito pessoal da história de Lisboa. Portas do Sol, Alfama.

Nuno Saraiva já colaborou praticamente em toda a imprensa nacional. Às sextas, encontramos os seus cartoons no Inimigo Público, que em 2022 passou a sair com o Expresso. Enquanto desenhador político, procura ser apartidário: Vou por causas, por valores, e cada vez menos por bandeiras. As bandeiras, ou o excesso de bandeiras, afunilam demasiado a ideia de democracia. Acho que, hoje em dia, as coisas são muito mais elásticas, mais diluídas. Acaba por ser absurdo falarmos na dicotomia esquerda-direita; as coisas confundem-se. Falarmos sobre o socialismo científico ou a doutrina marxista-leninista não faz sentido, não é do nosso tempo.”  

Ilustração criada para as Festas de Lisboa ’17.

Nascido na Mouraria, Nuno Saraiva apresenta-se como “uma pessoa da rua” e um “ilustra Lisboas”: “Embora não tenha vivido a infância Lisboavivi em Almadamas foi em Lisboa que fui nascer acidentalmente. E depois, quando para vim viver para cá, procurei moradia em bairros populares, que no fundo são o cenário dos meus desenhos.” No site de notícias “Mensagem de Lisboa”, assina a Banda Desenhada Aventuras de Lisboa, com textos de Ferreira Fernandes, e uma crónica da DECO centrada nas preocupações e discórdias da vida no bairro.  

Ilustração feita para a rubrica da DECO no site “Mensagem de Lisboa”.

A Lisboa que mais o inspira é “a dos selos” e dos locais, “mesmo os que estão em trânsito”, dos que vivem juntos sem ódios (italianos, franceses, moldavos, ucranianos), não se identificando, por oposição, com a Lisboa “dos nómadas digitais nem dos unicórnios das nossas praças: “A cidade sempre foi uma mistura muito interessante desde o século XII até hoje; é uma cidade de misturas de várias cores. E depois tem este céu maravilhoso, que cria uma imensidão de luz branca que é única.” Durante 4 anos, foram dele as imagens das festas e arraiais da cidade promovidas pela EGEAC. Atualmente, está a desenvolver os desenhos dos troféus das marchas, cujo tema deste ano é Amália, o que considera “um assunto delicado, absolutamente sacrossanto; é como em Fátima trabalhar a Nossa Senhora.” 

Cartoon publicado no “Inimigo Público” Série II, a 21 de janeiro de 2022.

O ilustrador é também professor em duas escolas de artes: a Lisbon School of Design, onde organiza um curso de ilustração digital, e na Ar.Co, onde dá workshops. Paralelamente, tem em mãos dois projetos editoriais ligados ao ensino, um livro de Filosofia do 11.º e um e-book do 8.º ano sobre História de Portugal focado em episódios de Resistência. Juntamente com dois sócios, está a investir na ilustração de azulejos através do Portugal Manual. No entanto, o seu projeto mais ambicioso é uma BD sobre o olhar de uma criança perante a Guerra Colonial: “somos uma herança dela político-económico-social e de valores; muito mal diferida da descolonização e acho importante contarmo-la às novas gerações.” 

Vou por causas, por valores, e cada vez menos por bandeiras. As bandeiras, ou o excesso de bandeiras, afunilam demasiado a ideia de democracia.”

Outros artigos

Edit.Set.Go! – Content makers

Edit.Set.Go! – Content makers
Somos uma boutique criativa que transforma boas ideias em estórias com impacto.

Criamos conteúdo de texto, imagem e vídeo para suportes impressos, digitais e multimédia. Trabalhamos de forma integrada e em todas as etapas da vida do produto, da definição do conceito à edição.

Revistas, Livros, Booklets, Catálogos, Websites, Newsletters, E-books, Vídeos Corporativos, Reportagens, Cobertura de eventos, Fotografia, Redes sociais.

Surgimos em 2008 para publicar, logo nesse ano, a Magnética Magazine, a primeira revista digital em língua portuguesa. Durante dez anos, o nosso diamante foi um verdadeiro marco no panorama editorial e, ao mesmo tempo que deu elevada expressão a inúmeros projetos e marcas em áreas tão diversas como música, moda, design ou lifestyle, inspirou profundamente a trajetória da Edit.Set.Go! até aos dias de hoje.

Mais tarde, abrimo-nos ao mercado e transportámos a paixão pelo storytelling para uma série de outros formatos, mas continuámos a encarar cada peça de comunicação com a mesma preocupação: a de a tornar única.

Hoje estamos offline, online e na fronteira que liga possibilidades infinitas a conceitos diferenciadores.

labdesign

Edit.Set.Go!