Noiserv: “O Plano é sempre o próximo disco.”

© Vera Marmelo

setembro, 2022

Noiserv: “O Plano é sempre o próximo disco.”  

Em 2022, Noiserv assinala 17 anos de carreira. Em julho, foi um dos convidados do POSTER. À boleia da mostra, falámos do seu último disco, dos concertos no Brasil e da sua incursão pela Literatura, com um livro que nos traz o lugar das coisas que podem ser e não ser.   

 

Que balanço fazes destes 17 anos? 

Disco após disco, um grande receio que tenho é sempre de desiludir as pessoas que um dia gostaram, mas tenho sentido que isso não tem acontecido. Há 17, quando comecei a gravar as músicas numa pequena mesa de mistura digital que eu tinha, era difícil imaginar que, 17 anos depois, ia deixar o meu trabalho de engenheiro, e conseguir estar 10 anos a viver da música. 

 

Já passaram quase dois anos desde o lançamento do teu último disco, “Uma Palavra Começada por N”. Achas que já houve tempo para o absorver? 

Parece que foi há menos tempo e eu continuo a fazer bastantes concertos de apresentação do próprio disco. Hoje em dia, parece que um disco já é velho pouco depois de ter saído. Sinto que este disco ainda não acabou a sua carreira, e ainda me faz sentido andar a tocá-lo sempre que posso. O disco já está com as pessoas, mas eu espero que ainda venha a estar mais. 

Mas, a longo prazo, o projeto é sempre o próximo disco. A pessoa não deixa de nascer pela primeira vez de cada vez que vai fazer um disco. Pelo medo de fazer mal, pelo receio de já não conseguir fazer… pelo receio de já não ser relevante para quem um dia gostou. Portanto, essa maturidade não dá segurança, apenas dá uma responsabilidade maior naquilo que se está a fazer. Mas o plano é sempre fazer esse disco novo.  

 

Que receção tiveste na passagem pelo Brasil? 

Às vezes parece que só a música brasileira chega cá e a música portuguesa não chega lá tão facilmente. E os concertos fora em salas mais pequenas do que aquelas em que costumo tocar aqui. E, por exemplo, no final do concerto de S. Paulo, houve três rapazes que me vieram dizer que já me ouviam desde 2014 e estavam à espera de me ver tocar no Brasil. E as pessoas condicionam a sua vida para nos verem tocar naquele dia, naquele lugar e isso é muito bonito. 

© Noiserv, POSTER Mostra, 2022

Na mesma altura, lançaste a “Noiserv Sound Machine”. O que te motivou a presentear os fãs com esta surpresa? 

A ideia é sempre ir criando objetos, pequenos momentos em que eu possa imortalizar a minha música ou as minhas ideias. Tenho sempre várias folhas soltas em que penso “está na hora de explorar esta ideia”. Esta ideia de uma caixinha de 16 sons diferentes em que cada um dos sons estaria dentro de uma das músicas era uma coisa que eu há muito tempo queria fazer. 

 

Estiveste a promover recentemente o teu livro, “três-vezes-dez-elevado-a-oito-metros-por-segundo”, que vai agora na segunda edição. Como é que tem sido esta experiência na Literatura? 

Já há muito tempo que gostava de ter feito um livro, mas, nesta questão da pandemia, um tipo de apoio, o Garantir Cultura, por parte do Governo, em que quem tivesse um CAE registado em cultura podia submeter um projeto. É um livro no qual eu já andava a trabalhar há bastante tempo, mas a edição era bastante cara, e eu queria fazer isto com muitos cortantes, um tipo de colagem diferente. O apoio precipitou o lançamento do livro. Tive receio de que as pessoas não lhe dessem importância nenhuma, mas era uma pessoa que vinha da música… mas tem sido uma ótima surpresa. 

 

Que mundo de sonho é este para onde o livro nos eleva? 

Acaba por ser uma ideia de um mundo de sonho num mundo criativo. Um lugar onde as coisas podem ser e não ser ao mesmo tempo. E é a nossa imaginação sobre aquilo que estamos a ver e sobre aquilo que estamos a imaginar que acaba por conduzir a história e nos dar uma das muitas narrativas possíveis que a história tem. 

O título passa para uma metáfora maior, porque não interessa verdadeiramente que a luz tem uma velocidade. Interessa a velocidade a que nos nós nos vemos uns aos outros. E a metáfora maior do livro é esta dinâmica de questionar como é que nós nos vemos uns aos outros, que pessoas da nossa sociedade é que se veem melhor umas às outras. Sem a luz, não víamos nada. E este livro fala de ver, de estar atento aos detalhes, ao que nos aparece à frente. 

 

Este ano, foste convidado do POSTER Mostra. Qual a estória por detrás do teu poster? 

Quando lancei o último disco, quis fazer um videoclip para cada uma das músicas, mas como uma narrativa comum em que cada vídeo era um género de plano de detalhe de algo maior. Tinha uma secretária forrada com pequenos papéis amarelos e cada um tinha palavras que faziam parte das letras daquele novo disco. Quando estava a fazer os vídeos, achei que aquilo tinha ficado tão bem que tirei várias fotografias à mesa, sem ter pensado que este poderia um dia ser o objetivo. Esta ideia de ter as palavras todas juntas… era quase como se eu tivesse feito tudo naquele lugar. Quando recebi o convite para participar, deu-me logo um clique. 

“Quando comecei a gravar as músicas numa pequena mesa de mistura digital que eu tinha, era difícil imaginar que, 17 anos depois, ia deixar o meu trabalho de engenheiro, e conseguir estar 10 anos a viver da música.”

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